terça-feira, 30 de setembro de 2008

K 2156: O Contacto!

Após ser anilhada em 15 de Março de 2006, e a mais de 2 anos da sua marcação, a Gralha-de-bico-vermelho com a anilha metálica K 2156, foi finalmente observada a mais de 60 km do seu local de captura e a escassas centenas de metros de Espanha. A sua identificação à distância foi possível após a observação da anilha de cor verde na pata esquerda.


Esta ave, à data da sua marcação terá ainda transportado um rádio-transmissor tipo “mochila” que permitiu o seu seguimento dentro dos limites do PNAlvão durante 6 meses. Após este período deixou de ser observada, embora se julgue que tenha mantido ainda por algum tempo o transmissor; esta observação permitiu ainda confirmar a ausência da “mochila” que de certo modo a equipa de rádio-seguimento já esperava. Esta observação reveste-se ainda de elevada importância para o estudo comportamental e social da espécie, uma vez que não se encontram referências sobre eventuais deslocações de Gralhas-de-bico-vermelho para Portugal a partir dos núcleos conhecidos.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

As Gralhas-de-bico-vermelho no PNSACV

Após algumas trocas de e-mails com o Pedro Portela (Vigilante do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina- PNSACV), tendo como tema de conversa as Gralhas-de-bico-vermelho, e na perspectiva de uma parceria entre este grupo de trabalho e o PNSACV, foi agendada uma reunião para discutir algumas metodologias. Esta reunião foi realizada em Odemira, no dia 27 de Agosto, onde estiveram presentes o Paulo Travassos, Carla Pereira, Paulo Barros (Projecto Bico-vermelho), Pedro Portela (Vigilante PNSACV) e Pedro Rocha (Director Adjunto da DGAC-Sul), que nos ocupou a manhã toda.

Após a degustação de uma bela feijoada de gambas, saboreada no refeitório do mercado de Odemira, ruma-mos para Sul em direcção a Sagres, na companhia do Pedro Portela, com o objectivo de observar Gralhas-de-bico-vermelho. Depois de uma hora de viagem deparámo-nos com um grupo de aves que se alimentavam num pousio, de onde se destacava um grupo de aves pretas cuja silhueta nos parecia familiar. Neste grupo, além de Gralhas-pretas (Corvus corone), de imediato se identificaram Milhafres-pretos (Milvus migrans), Peneireiros (Falco tinnunculus), Falcão-peregrino (Falco peregrinus) e, um grupo de 42-46 indivíduos de Gralha-de-bico-vermelho.
Este primeiro contacto foi para nós uma novidade em termos de comportamento alimentar. Embora já tivéssemos tido a oportunidade de ler o testemunho do João Carlos Farinha sobre tal facto, nunca tivemos a oportunidade de observar Gralhas-de-bico-vermelho pousadas no topo dos cardos (Cynara sp), a alimentarem-se a partir da influrescência. Após alguma surpresa em relação a este comportamento, questionámo-nos se estas aves se alimentariam das sementes dos cardos. Não deixamos de procurar o que haveria sob a influrescência dos cardos, e cedo constata-mos que sob estas, para além das sementes dos cardos, existia um manancial de larvas, que possivelmente seria as presas que as aves procuravam. Este facto vai com toda a certeza conduzir-nos a um novo desafio no âmbito do estudo da dieta alimentar desta espécie.
Após breve paragem entre Vila do Bispo e Sagres, seguimos caminho em direcção do mar sempre para sul pisando a pouca terra que nos separava do mar. Parando aqui e ali, sempre que um monte abandonado se nos deparava, na perspectiva de encontrar algum dormitório ou local de nidificação preferencialmente localizados em estruturas, como casas abandonadas ou resguardos para os animais (comportamento normal nesta espécie em outros países), mas que no final apenas confirmou os nossos receios: a Gralha-de-bico-vermelho não tem preferência por construções humanas (pelo menos actualmente).Chegados à linha de falésias da zona de Sagres, o Pedro Portela conduziu-nos a um dormitório comunal e possível local de nidificação.


Este cenário, à beira mar plantado, além de belo e com a linha do horizonte a afundar-se no mar, era para nós desigual em tudo o que nos ligava à espécie que há muito tempo vimos seguindo nas terras de montanha do norte. Por momentos, fez-nos recordar a ilha de Islay e a linha de costa que aí dá abrigo a dezenas de aves desta espécie.

Após alguns momentos de reflexão sobre as características comuns e as diferenças entre as duas costas a Norte e a Sul da Europa e as nossas serras do interior norte, decidimos partir desta feita para Oeste, na tentativa de observar as Gralhas-de-bico-vermelho a recolherem num outro abrigo, situado na linha de costa para norte do Cabo de Sagres.
Chegados ao destino, após algum tempo de espera, eis que ao longe observamos um par de Gralhas-de-bico-vermelho a aproximar-se, depois mais duas e outra e mais outra, contabilizando num primeiro momento 6 indivíduos.

Enquanto esperávamos pela chegada de mais exemplares de Gralhas-de-bico-vermelho eis que se observa muito ao longe, ao largo da costa um bando do que fazia supôr ser algumas dezenas de gralhas, que acabaram por se perder na linha de costa. Na tentativa de descobrir um novo dormitório, sem mais demoras dirigimo-nos para o local. Chegados aí fomos surpreendidos por um bando de Gralhas-de-nuca-cinzenta; afinal o que o nosso entusiasmo nos tinha levado a pensar ser um dormitório de Pyrrhocorax pyrrhocorax era afinal um dormitório de Corvus monedula. No entanto, não deixamos de observar atentamente os exemplares desta espécie que é escassa no interior norte do país e, que utilizam a costa Sudoeste como local de ocorrência, sendo uma zona de eleição para a observação deste corvídeo.

Enquanto andávamos de um lado para outro atrás de Corvus monedula, o bando que havia-mos observado durante a tarde tinha chegado ao local do dormitório onde tínhamos planeado a espera. E, numa azáfama, lá regressamos nós ao dormitório onde anteriormente tínhamos estado, deparando-nos apenas com meia dúzia de Gralhas-de-bico-vermelho pousadas na falésia sobre o dormitório. A sua permanência durante longos minutos permitiu a observação atenta de algumas características de imaturidade destas aves que nos podem indicar a existência de indivíduos nascidos este ano, e que só recolheram ao dormitório após alguns chamamentos dos possíveis progenitores.

Por esta altura já escurecia, e o vento forte empurrava-nos para dentro da viatura como que a dizer que eram horas de rumar para outro extremo de Portugal, bem a Norte. No entanto, antes de terminar esta breve visita ao extremo SW, não quisemos abandonar o local sem observar a recolha das últimas aves em jeito de despedida.
Desta feita, após um último olhar sobre a silhueta de uma ave negra de bico curvo sobre o mar, lá deixamos a linha de costa um pouco a contra gosto, e dirigimo-nos para Odemira onde haveria de ficar o nosso anfitrião e guia, Pedro Portela. Neste périplo por terras que constituem o último reduto das Gralhas-de-bico-vermelho (Pyrrhocorax pyrrhocorax) no sul de Portugal deixámos a promessa de uma estreita colaboração em prol desta espécie emblemática e a certeza de lá voltar com mais tempo.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Vídeo-monitorização no núcleo de Gralha-de-bico-vermelho da Serra do Barroso

A importância de um sistema de monitorização reside, principalmente, no fornecimento contínuo de informações e dados suficientes em tempo real. É neste contexto que o uso de instrumentos visuais remotos, através da aquisição de imagens com câmaras de vídeo, tem-se tornado numa técnica viável e promissora.
Com este sistema de vídeo-monitorização pretende-se avaliar o comportamento no interior de um dormitório de Gralha-de-bico-vermelho. O sistema em questão é um sistema de captura e transmissão de imagem e é constituído pelos seguintes elementos: uma câmara de infravermelhos, um computador e a alimentação (bateria). Este sistema de monitorização tem por base a seguinte metodologia: a área do dormitório a captar é filmada por uma câmara de infravermelhos (que tem a particularidade de ser invisível para as aves), que se encontra ligada a uma placa de captura de vídeo, localizada num PC. Através das imagens que nos chegam pelo monitor do interior do dormitório é-nos possível visualizar o número de indivíduos, a hora da entrada e a utilização dos poisos pelos indivíduos.
Com este sistema é também possível a transmissão das imagens capturadas, bastando o computador possuir o software especializado para a transmissão das imagens capturadas via IP e ligação a um modem GPRS, possibilitando assim a visualização das mesmas em qualquer ponto de acesso à Internet e permitindo o seu armazenamento para processamento futuro. Ou seja, a oportunidade de vídeo-monitorização remotamente sem a deslocação ao local.

O vídeo que se segue foi obtido a 30 de Janeiro de 2008, quando o grupo era constituído por 41 indivíduos (bando de Inverno).


Durante a campanha de saídas de campo à serra do Barroso foram realizadas filmagens no dormitório comunal. Com este sistema foi-nos possível determinar a hora da 1ª ave a entrar no dormitório, como observar o comportamento dos indivíduos no interior do abrigo.

No quadro abaixo indicado, é possível observar as datas que foram realizadas filmagens, bem como o tempo de filmagem e o número de indivíduos que ocuparam nesse dia o dormitório.




O vídeo seguinte é um exemplo de uma filmagem ao anoitecer.



Caso tenha dificuldade em visualizar os vídeos faça o download dos codecs em:
http://www.free-codecs.com/geovision_cctv_mpeg4_codec_download.htm
Para instalar pressione o botão direito do rato e seleccione instalar.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

terça-feira, 27 de maio de 2008

A Vida no Campo

domingo, 25 de maio de 2008

As Gralhas-de-bico-vermelho também pousam em árvores

Para quem nunca viu uma Gralha-de-bico-vermelho numa árvore, aqui está !!!

For those who never saw a Chough on a tree, here is!!!!


Paulo Barros

domingo, 4 de maio de 2008

Os abrigos de Islay

Aproveitando a participação no 2nd International Workshop on the Conservation of the Chough (Pyrrhocorax pyrrhocorax), realizado no Scottish Agricultural College, Ayr Escócia, que decorreu nos dias 13 e 14 de Setembro de 2007, eu e o Paulo Travassos rumamos para a ilha de Islay (61956 ha) a fim de observar algumas gralhas-de-bico-vermelho num habitat diferente do qual estávamos habituados a ver, nesta visita tivemos ainda a companhia da Maria Bogdanova (bolseira de pós-dotoramento), que trabalha com esta espécie na ilha e Anne Delestrade (Directora do Centre de Reserches sur les Ecosystèmes d’Altitude-CREA).
O número de pares reprodutores na ilha de Islay é aproximadamente de 60 e a população total é de cerca de duas centenas e entre o ano de 1982 e 2006 foram marcadas com anilhas de cor 1200 aves.

No decurso da nossa visita pela ilha fomos, observando grupos de gralhas-de-bico-vermelho e visitando alguns dormitórios existentes. Podendo estes, dividirem-se basicamente em dois grupos: os naturais e os antropogénicos.

De entre os naturais foi possível observar escarpas de afloramentos graníticos, e pequenas grutas junto ao mar provocadas pela erosão das ondas.
De entre
as antrópicas foram observadas construções antigas, como palheiros, armazéns e bunkers, construções modernas como por exemplo um telheiro (construído em metal) para guardar silagem e fenos.

Por fim, foram ainda observados construções antrópicas construídas com a exclusiva finalidade de potenciar locais de domitório/nidificação para esta espécie. Estas, não são mais do que pequenos palheiros construídos em madeira com duas aberturas a meia altura (tipo janelas) e poisos no seu interior. De referir ainda que os resultados da ocupação destas construções tem sido bastante satisfatória, havendo registos de ocupação por parte de grupos não reprodutores e por casais reprodutores.

Fotos: Paulo Travassos e Maria Bogdanova

Paulo Barros

quinta-feira, 17 de abril de 2008

A situação em Portugal da Gralha-de-bico-vermelho (Pyrrhocorax pyrrhocorax)

A Gralha-de-bico-vermelho é uma ave com uma estrutura social centrada em dormitórios comunitários, normalmente associados a zonas costeiras ou montanhosas; e encontra-se distribuída por uma vasta mas descontínua área desde a Europa, o Médio Oriente, a Ásia Central até ao Noroeste e o Nordeste de África. No entanto, por toda a sua área de distribuição, esta espécie tem vindo a sofrer uma tendência regressiva nos últimos dois séculos, culminando com a sua extinção em algumas regiões.

Os dados relativos à sua ocorrência e distribuição em Portugal, para a primeira metade do século XX encontram-se referidos por autores entre 1924 e 1945 os quais deixam transparecer que esta espécie poderia ser relativamente comum no território nacional. A partir de 1950 surge a indicação da existência de núcleos como Vila Nova de Mil Fontes, Cabo de S. Vicente e Ponta de Sagres, sem contudo serem apontadas estimativas para a população nacional até ao ano de 1978.

Embora por esta altura fosse reconhecida a preferência desta ave por encostas escarpadas em áreas de montanha, por alcantilados de rio ou por falésias na nossa costa, a situação da sua população neste tipo de biótopos era ainda mal conhecida. Com o desenvolvimento dos trabalhos referentes ao Atlas das Aves que Nidificam em Portugal Continental (1989) surge o primeiro esboço da distribuição e nidificação da Gralha-de-bico-vermelho no nosso território assinalando-se então a sua presença em áreas como a: Serra do Gerês, Douro Internacional, Serra da Estrela, complexo das Serras de Montejunto–Aire-Candeeiros, rio Chança e Costa Sudoeste. De 1986 a 1988 e 1990 surgem dois censos que apontam para 755 e 555 indivíduos (para 6 núcleos conhecidos) respectivamente, evidenciando-se assim uma regressão da espécie em dois anos.

Com o início da década de 90 do século passado surgem novos dados a partir de trabalhos regionais que permitem obter estimativas para áreas como Peneda-Gerês, Douro Internacional, Serras do Alvão e Marão, Serras de Aire e Candeeiros, Costa Sudoeste. Para além das áreas reconhecidas como de nidificação potencial para a espécie, surgem também referências de observação de indivíduos em Arrábida/Cabo Espichel, Alcochete (Tejo), Peninha/Sintra; Minas de Neves Corvo e Serra de Montesinho. Simultaneamente é registado o desaparecimento de núcleos na Serra do Marão e Idanha-a-Nova.

Núcleos reprodutores; Ocorrência regular; Observações pontuais

A redução do número de aves desta espécie, desde a década de 70 até à actualidade, tem vindo a reflectir-se nos locais de dormitório comunal assim como na ocorrência do número de casais reprodutores. A regressão generalizada deve-se, segundo a bibliografia, ao abandono e as alterações dos sistemas tradicionais e de pastoreio extensivo. Porém, alguns estudos apontam para mudanças do comportamento e a interrupção da reprodução, evidenciando que para haver sucesso reprodutor é necessário que se encontrem reunidas todas as condições favoráveis, desde a qualidade do habitat, a idade dos casais reprodutores até ao risco de predação e doença. A perturbação humana é também uma hipótese a considerar, atendendo à possibilidade de pilhagem de ninhos, escalada e trilhos de actividades ao ar livre.

De acordo com os requisitos desta espécie, poderá ser necessário: a criação de incentivos para a prática da pastorícia tradicional; o estímulo à implantação de sistemas de pastoreio em regime de estabulação livre e semi-estabulação, em particular do gado bovino; dificultar o acesso humano aos dormitórios de forma a evitar a perturbação, ordenamento das actividades públicas de acordo com os locais de nidificação, dormitórios comunitários; controlar a florestação nas áreas de habitat de alimentação; e integração dos requisitos ecológicos da espécie nos planos de ordenamento.

Para uma favorável conservação da Gralha-de-bico-vermelho em território nacional, de acordo com a bibliografia disponível, é urgente a criação de um Grupo de Trabalho sobre a Gralha-de-bico-vermelho (Pyrrhocorax pyrrhocorax) de forma a realizar um censo à escala nacional para estimar a sua população, determinar a tipologia de dormitórios, compreender a flutuação anual do número de indivíduos no seio dos núcleos populacionais e determinação dos factores de ameaça à conservação da espécie.Só através de um esforço concertado se poderá desenvolver uma monitorização de parâmetros populacionais que permitam avaliar a distribuição e abundância desta espécie com vista a inverter a tendência regressiva no nosso país.


Paulo Travassos